A propósito do Dia Mundial do Cancro, efeméride internacional celebrada a 4 de fevereiro, o Jornal de Albergaria compilou algumas pistas sobre o aumento, desde os anos 90, de quase 80% de diagnósticos de cancro em pessoas com menos de 50 anos; sendo esta uma data que visa aumentar a consciencialização relativamente ao cancro e encorajar a prevenção e deteção precoce.
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Os novos casos de cancro entre pessoas com menos de 50 anos aumentaram 79,1% em todo o mundo entre 1990 e 2019, enquanto o número de mortes subiu 27,7%, de acordo com um estudo publicado no BMJ Oncology. Tracey Woodruff, diretor do programa focado em Saúde Reprodutiva e o Ambiente da Universidade de São Francisco, faz notar que o aumento num espaço tão curto de tempo não está apenas relacionado com fatores genéticos.
A maioria dos casos “de início precoce” ocorre em países desenvolvidos e cerca de 2/3 dos casos de cancro abaixo dos 50 anos são diagnosticados em mulheres. Os tipos de cancro mais comuns nesta faixa etária têm sido o colorretal, de mama e de pele. O aumento mais rápido foi observado nos da próstata e nasofaringe.
Em Portugal, “os cancros mais globais, até nestas idades mais jovens, são o da próstata no homem, da mama na mulher e o do pulmão em ambos”, disse António Araújo, diretor do Serviço de Oncologia Médica do Centro Hospitalar Universitário de Santo António, no Porto, à CNN Portugal.
Para a médica oncologista Daniela Macedo, entrevistada também para a peça da CNN, “há, de facto, uma mistura de várias coisas” em jogo no caso dos diagnósticos de cancro em pessoas mais jovens, sendo um deles o facto de as pessoas estarem “mais atentas e mais informadas, apesar de ainda haver alguma iliteracia em saúde”.
Somos o que comemos?
Um estudo realizado nos Estados Unidos concluiu que os homens que mais consumiam alimentos ultraprocessados (UPF, sigla em Inglês) tinham 29% mais risco de desenvolver cancro colorretal. Estes alimentos passam por um extenso processo industrial e contêm ingredientes raramente usados na culinária caseira; como corantes, conservantes, adoçantes artificiais e emulsificantes. Refrigerantes, comidas pré-feitas, doces são alguns dos exemplos mais presentes no quotidiano.
O consumo elevado de UPFs tem aumentado significativamente em países desenvolvidos onde chegam a representar, em alguns casos, 50-60% da ingestão calórica diária. Um dos grandes constrangimentos destas pesquisas está no facto de os estudos sobre alimentação se basearem em relatos – o que achamos que comemos nem sempre corresponde ao que realmente comemos, alerta Lynn Turner, diretor do departamento de pesquisa na Worldwide Cancer Research, citado pelo The Guardian.
Para além do foco no diagnóstico precoce, os especialistas recomendam a adoção de um estilo de vida saudável como fator benéfico para prevenção de doenças no geral. “Primeiro temos de incutir nas crianças hábitos de vida saudável, boa alimentação, ingestão de água, evitar o álcool e o tabaco, praticar exercício com regularidade, isto são pormenores na vida da pessoa que farão com que, em princípio, viva mais saudável mais tempo. Depois, temos de implementar e reforçar os rastreios, temos o da mama, colorretal e colo do útero, é fundamental que seja incluído o rastreio do cancro do pulmão”, defendeu António Araújo, na mesma entrevista.
“Químicos eternos” e pele com memória
No caso do cancro da mama, fatores reprodutivos, como a maternidade tardia e a diminuição da amamentação, podem estar a contribuir para o aumento dos casos. A exposição a “químicos eternos” (PFAS), presentes em produtos químicos utilizados em itens como embalagens de alimentos e cosméticos, podem mexer com os níveis hormonais e aumentar o risco de cancro.
Os PFA, como o nome sugere, têm propriedades que os tornam extremamente persistentes no ambiente e no corpo humano. A sua atuação como desreguladores endócrinos, isto é, que interferem com o sistema hormonal, aumenta os níveis de estrogênio ou imita o efeito do estrogênio, podendo ser prejudicial à saúde.
Daniela Macedo lembra que “há muitos casos em mulheres jovens, estão mais atentas e vão mais ao médico, mas estamos a falar sobretudo de fases precoces, que é o que se está a encontrar, são cancros em fase curativa de doença”. No entanto, a médica destaca que “tem-se notado uma diminuição da idade no diagnóstico”, explicando que, para tal, também contribui o facto de “a partir dos 35 anos” haver “uma preocupação por parte dos médicos de ginecologia e obstetrícia nesse sentido”.
O cancro de pele também é crescente entre os mais jovens, com a exposição excessiva aos raios UV sendo o principal fator de risco. Embora a consciencialização sobre os danos do sol tenha aumentado, a adesão a medidas preventivas como o uso de protetor solar ainda é insuficiente, especialmente entre jovens.
James Larkin, oncologista nas unidades de dermatologia e urologia do Hospital Royal Marsden, citado pelo The Guardian, alerta para a necessidade de atenção à exposição solar desde cedo, sendo que, o impacto deste excesso pode ter sido cometido “há décadas”. Ou seja, a maior consciencialização e acesso à informação sobre os perigos da exposição excessiva não tem necessariamente um impacto nos números de casos diagnosticados.