Cláudio Alves, bombeiro há 15 anos, sempre teve cães e gatos. No incêndio que lavrou durante oito dias, no início de agosto, em Ponte da Barca, o soldado da paz parou para dar de comer a um cão desamparado. O vídeo rapidamente se tornou viral, mas a ligação dos Bombeiros de Ílhavo aos animais já vem de longe… Os capítulos desta história de amor incluem um cachorro criado no Quartel e um bode chamado Tomé.
Foto tirada pelo bombeiro Sérgio Henriques dos BV da Murtosa
“Como bombeiros, a nossa missão e obrigação prioritária é salvar pessoas e bens, mas não podemos excluir os animais. Sempre que conseguimos, também é a nossa missão ajudá-los”, são palavras de Cláudio Roberto Alves, em declarações ao Jornal de Albergaria. O bombeiro da corporação de Ílhavo ficou conhecido no mundo digital após a circulação de um vídeo que mostra o soldado da paz a alimentar um cão que fugia do inferno que tem assolado o país há quase um mês.
A ação que comoveu milhares de internautas decorreu no início de agosto, após uma “noite muito árdua” em Ponte da Barca, sem ocasião para dormir, numa missão de combate às chamas feita em equipa com os Bombeiros da Murtosa. O incêndio lavrou durante oito dias seguidos, resultando em mais de sete mil hectares de área ardida e, com ela, muito do pasto essencial para a sobrevivência do gado e animais selvagens.
No vídeo da madrugada seguinte, já de vigilância num ponto estratégico para tal, vê-se Cláudio Alves a abrir uma saqueta de ração para dar de comer a um cão desamparado e exausto. No final, estão os dois deitados no chão, em repouso, com o bombeiro a descansar a cabeça no tronco do cão enquanto lhe ‘faz festas’ no pescoço e focinho.
“Foi uma história com um final feliz. Começámos a ouvir um jipe que o cão reconheceu como familiar. Percebemos que o proprietário já andava na zona à procura dele. O cão pertencia a uma vacaria que ficava no cimo da serra. São cães que andam soltos, mas notou-se que teve uma reação positiva ao ver o jipe”, lembrou Cláudio Alves.
Nessa mesma noite, ainda sem acesso à ração deixada pelos populares no centro logístico, o bombeiro partilhou a sua refeição com um outro amigo patudo. Foi por essa circunstância que se lembrou de levar consigo sustento para outros companheiros que pudessem encontrar pelo caminho. “Essa boa-vontade das pessoas é de louvar. Não só pela doação, mas por se lembrarem dos animais nestes momentos”, elogiou o bombeiro.
Tomézinho
Cláudio sempre gostou de animais e cresceu entre cães e gatos. Agora, os tradicionais animais domésticos que habitam na casa do bombeiro coexistem com porcos, cabritas e galinhas, todos juntos no espaço exterior. O ‘bichinho’ de estar rodeado de ternurentos amigos passou para o Quartel ilhavense, onde a interação dos soldados da paz com animais vai muito além do comum resgate.
Uma das estrelas da corporação é o cão Trup. O animal foi salvo num acidente de viação para o qual os operacionais tinham sido notificados. O condutor estava alcoolizado e foi detido. O carro foi para a sucata e o pequeno cachorro ficou com os bombeiros que o resgataram. Hoje, tem 14 anos. “Passou a morar no Quartel e é bombeiro a tempo inteiro, como costumamos dizer. Já foi à televisão, já é famoso e muito acarinhado por todos”, contou-nos Cláudio Alves, entre risos de carinho.
Com cães e gatos no Quartel, vive um bode chamado Tomé, Tomézinho para os amigos. “É um pouco fora da caixa, sim. Todos os dias vou alimentá-lo, levo-lhe acácias fresquinhas. Também come tostas, ração, erva e tudo o que é de plantas”, relatou. O gosto de Tomé por pequenas tostas motivou uma parceria com uma empresa da área, sediada em Oliveirinha, que assegura o petisco predileto.
Todos são bem-vindos
A aventura de acolher animais fora do comum aguçou-se quando um cabrito pertencente ao pai de uma bombeira chegou à corporação, por não se dar bem com alguma vizinhança. “O cabrito era meio atravessado e, às vezes, espalhava os velhotes no chão… Ela pediu ao comandante se podia levá-lo para lá”, recordou o bombeiro. E assim fez.
Já há uma década, na inauguração do novo Quartel, um conterrâneo ofereceu um bode aos bombeiros para festejarem com um grande banquete. “Nós nunca comemos o animal. O bode morreu de velhice. Como já tínhamos ‘o hotel’ montado, a minha colega lembrou-se de levar para lá o bode que pertencia ao pai”, partilhou.
Na brincadeira, um dia, Cláudio sugere “arranjar uma namorada” para o mais recente residente do Quartel. “Até que, arranjei mesmo. Consegui que nos fosse emprestada uma fêmea e nasceram dois cabritinhos. Um deles, como ficou acordado, devolvi quando fui levar a fêmea de volta. O outro, é o Tomé. Literalmente nascido e criado no Quartel, com muito mimo e carinho”, relatou Cláudio Alves.
Tomé sai da casota todos os dias, para ir passear no jardim à beira da rotunda, junto ao Quartel. “Esta interação torna-o muito comunicativo e inteligente nas suas atitudes. É quase um cão no corpo de um bode, é muito engraçado. Já sabe quando é para pôr o colete, para ir passear…”, sorria o bombeiro.
Para que tudo isto seja possível, é preciso quem deixe. Cláudio Alves faz questão de agradecer a abertura do presidente da Associação Humanitária dos Bombeiros de Ílhavo, Pedro Rosa Novo. “Ele sempre apoiou esta iniciativa de termos animais no quartel e sempre assegurou condições para tal, de alimentação e veterinário. Isso é muito importante”, louva o bombeiro.





