O ministro da Agricultura e Pescas e o secretário de Estado das Florestas reuniram com autarcas locais após visita a áreas ardidas no concelho. António Loureiro, presidente da Câmara Municipal de Albergaria, pediu “coragem política e um pacto com outros partidos” para investir na floresta a médio-longo prazo.
José Manuel Fernandes, ministro da Agricultura e Pescas, foi recebido em Albergaria-a-Velha, no monte da Nossa Senhora do Socorro, com um agradecimento pela “confiança, preocupação, proximidade aos munícipes; transparência e rapidez” com que está a ser feito o processo de levantamento de danos em articulação com o Governo, nas palavras de António Loureiro, presidente da Câmara Municipal de Albergaria.
As propriedades abandonadas e espécies infestantes foram dois problemas apontados pelo edil em conversa com o ministro e o secretário de Estado das Florestas, Rui Ladeira. José Manuel Fernandes responde que continua em cima da mesa “uma reafectação de 40 milhões no PRR para dar máquinas às Câmaras Municipais para limpezas e um montante para combater as infestantes, sobretudo para estas zonas, como outras do Norte”, assegura.
O ministro falou igualmente do despovoamento e da necessidade de tornar zonas fora dos grandes centros urbanos “mais atrativas, através dos fundos da coesão territorial”; sem deixar de mencionar os “incendiários que temos de combater”.
António Loureiro pediu “coragem política e um pacto com os outros partidos” para que estejam asseguradas soluções fora do imediatismo do quotidiano. “A floresta não cresce de um dia para o outro, demora décadas. Uma floresta resiliente e que dê respostas ambientais requer investimento a médio a longo prazo”, disse. José Manuel Fernandes assegura que está “acertado com o ministro do Ambiente, financiado pelo Fundo Ambiental, um programa de apoio aos baldios”.
500 milhões sem data marcada
“A nossa prioridade é a reparação, acudirmos o mais rapidamente possível àqueles que foram atingidos por esta tragédia. Tenho, desde logo, uma preocupação em assegurar as rações para os animais. Há uma outra urgência, onde as Câmaras Municipais e equipas do ICNF estão a ajudar, que é a estabilização dos solos, agora com as chuvas. Estas medidas de estabilização pagamos a 100% após análise prévia do impacto de cada incêndio”, disse o ministro.
Foram igualmente mencionados “apoios para os agricultores que viram as suas culturas e alfaias agrícolas destruídas”. José Manuel Fernandes indica que o Governo poderá recorrer aos recém-anunciados 500 milhões de euros do Fundo de Coesão da UE ou ao Orçamento do Estado para apoiar as zonas afetadas pelos incêndios, dependendo de um equilíbrio entre o que for mais rápido e benéfico para cada situação.
“O que não existe e devia existir são instrumentos europeus que fossem de ajuda imediata e que não demorassem tempo – não existem, nem para tragédias nacionais deste tipo. Hoje falamos em incêndios, um dia destes podem ser cheias”, disse.
Sem previsão certa para a chegada de apoios, José Manuel Fernandes informa haver casos em que não quer “falar de meses”, esperando que a solução seja mais célere. “Não abandonamos ninguém. Os primeiros apoios que são, por exemplo, para a alimentação dos animais, são uma urgência. Na próxima semana tem de estar resolvido”, afirmou, lembrando o incêndio de Pedrógão em 2017 para a qual só foi aprovado o Fundo de Solidariedade em 2018, como referiu, tendo sido um dos negociadores no processo.
Sobre dinheiro vindo do Fundo de Solidariedade da União Europeia, o ministro não exclui a hipótese, mas explica ser de evitar “porque implica estragos na ordem dos 3 mil milhões de euros, 0,6% do PIB”.
“Os nossos filhos querem abandonar a floresta”
“Uma obra divina. Foi um dos nossos projetos de áreas agrupadas – ali, aquela ilha verde com tudo ardido à volta. É um exemplo de floresta agregada, onde se juntam vários terrenos para gestão comum; de forma a conseguir mais eficiência e escala”, apresentou Luís Sarabando, coordenador da AFBV – Associação Florestal do Baixo-Vouga, referindo-se a uma área de 17 hectares, que era de nove proprietários, composta por 85% de eucalipto.
A AFBV defende que “esta provocação, de um movimento de agregação” funciona como solução para o abandono das terras, para quem aceitar ceder a gestão das propriedades e tenha escala suficiente para incorporar um destes projetos.
O presidente da AFBV, José Francisco Matos da Silva, sugere ainda que quem tenha de abandonar o lucro trazido pelo eucaliptal em prol da introdução de uma faixa de proteção na floresta “seja ressarcido, como a rede energética nacional faz quando passa por propriedades”. A Associação alerta, no entanto, para abusos nas plantações de eucalipto e incumprimento de regras de distanciamento e criação de corredores de segurança.
“Os nossos associados dizem-nos ‘eu não consigo continuar porque não tenho forças, os nossos filhos querem abandonar a floresta’ e o nosso esforço é fazer esta gestão conjunta para que os 30% de floresta abandonada não cheguem aos 40%. Aí temos uma tragédia a sério”, reforça o presidente da AFBV.
O ministro da Agricultura não responde diretamente, mas assegura que o Governo tem uma visão holística da floresta. “O Pacto Nacional que vamos elaborar para a floresta considera-a do ponto de vista económico, social e ambiental. Há quem olhe só para uma destas vertentes, mas temos de as analisar em conjunto. Sem rendimento na floresta, o abandono aumenta”, concordou o ministro.
A reunião com o executivo municipal e presidentes de Junta de Freguesia decorreu após as declarações aos jornalistas citadas nesta peça.