Portugal não tem usado de forma correta fundos estruturais para intervir na gestão florestal pós-fogo, já que as intervenções foram tardiamente operacionalizadas no terreno e não existiu uma seleção das áreas a intervir. São as duas principais conclusões de um estudo feito pela Universidade de Aveiro (UA) sobre a gestão florestal pós-fogo realizada no país com recurso a financiamento público.
Realizado pela investigadora Cristina Ribeiro, do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar da UA, o estudo no âmbito do Doutoramento realizado no Departamento de Ambiente e Ordenamento da UA centrou-se na “definição de orientações para a definição de uma política de gestão pós-fogo em Portugal, com base na articulação dos interesses e necessidades dos agentes-chave do setor e integrando o conhecimento técnico e científico já disponível e as experiências de outras regiões do mundo”. Abordou também a aplicação dos fundos estruturais que Portugal tem beneficiado, desde os finais dos anos 80 até à atualidade, para intervenções de gestão pós-fogo. “Fundos que desde 2007 têm como principais objetivos a estabilização de emergência para prevenir o risco promovendo a conservação do solo e da água, e promover a médio e longo a regeneração e o restauro das florestas afetadas” pode ler-se numa nota da UA.
Cristina Ribeiro focou-se no financiamento de 25 milhões de euros de investimento elegível financiado, através do Programa de Desenvolvimento Rural PRODER (2007-2013), em intervenções de estabilização de emergência, que consistiram em tratamentos de encostas, caminhos e linhas de água, e tratamentos de reabilitação de povoamento, reflorestação e reabilitação de habitats florestais e apontou duas grandes falhas na aplicação desta quantia.
Primeiro, “as intervenções foram tardiamente operacionalizadas no terreno”, garante. “A estabilização de emergência deve ser realizada no terreno, imediatamente após a ocorrência do incêndio, antes do aparecimento das primeiras chuvadas”, descreve, acrescentando que “em Portugal, as intervenções financiadas no âmbito do PRODER foram aprovadas no final do primeiro inverno após a ocorrência do incêndio, havendo intervenções que foram aprovadas mais tarde”.
A segunda falha apontada por Cristina Ribeiro prende-se com a não existência de uma seleção das áreas a intervir. “O conhecimento científico e a experiência internacional evidenciam que as intervenções, pelo menos as de estabilização de emergência, não podem ser realizadas em toda a área ardida (por questões temporais e económicas), mas devem ser feitas em áreas consideradas prioritárias, face aos riscos e valores em risco existentes na sua envolvente”, aponta. Efetivamente, descreve, “em Portugal a avaliação da área ardida não tem identificado a área de intervenção prioritária, como tal as intervenções têm surgido aleatoriamente distribuídas pela área ardida”.
Soluções para a gestão pós incêndios florestais ser eficaz
De forma a solucionar as falhas apontadas, Cristina Ribeiro afirma que as intervenções devem ser realizadas de forma mais célere possível, se possível ainda durante a ocorrência do fogo rural, com a avaliação da área ardida efetuada por uma equipa de especialistas multidisciplinar. “O tempo que medeia entre a ocorrência do incêndio e a realização efetiva das intervenções, no terreno, está a ser muito longo, sobretudo na estabilização de emergência, o que faz com que as intervenções quando acontecem já estejam desajustadas das necessidades”, reforça.
Por outro lado, a investigadora realça que mais importante do que a área financiada ou o valor do financiamento é necessário perceber qual é o benefício real do investimento, que não é conhecido “por falta da monitorização das intervenções que permita aferir esses resultados”. “A política de gestão pós-fogo a desenvolver em Portugal deve estar enquadrada numa estrutura composta por duas fases temporais, com objetivos específicos e com escalas temporais espaciais distintas”. A primeira fase, de estabilização de emergência, decorre durante o primeiro ano após o fogo e a segunda fase, de regeneração e o restauro da floresta, que surge na continuidade da anterior, decorrerá até cerca de 5 anos após a ocorrência do incêndio.
Paralelamente, Cristina Ribeiro faz notar que Portugal deve estar dotado de equipas de especialistas pluridisciplinares, para a avaliação das áreas ardidas e avaliação da regeneração e restauro de áreas ardidas. Deve ainda “criar orientações nacionais para a criação da equipa de agentes nacionais, regionais e locais que acompanhem cada fogo rural e a criação dos mecanismos necessários para o seu funcionamento” bem como conceber um “Fundo de Emergência que seja facilmente disponibilizado e que permita avançar com os trabalhos necessários imediatamente após o fogo rural”.