O Jornal de Albergaria optou por entrevistar estes cabeças de lista por serem porta-vozes dos partidos que, simultaneamente, têm maior representatividade no voto albergariense em eleições nacionais e locais, considerado os resultados das Legislativas 2022 e Autárquicas 2021 – PS, AD (PSD/CDS/PPM), Chega, BE, IL e CDU (PCP/PEV). Chega e IL não responderam.
Os cabeças de lista são os candidatos mais prováveis de, dependendo do resultado do partido que lideram localmente, ter lugar no Parlamento. Nas últimas Legislativas, em 2022, foram eleitos pelo círculo eleitoral aveirense – composto por 642 185 inscritos e com 16 mandatos por distribuir – 8 assentos pelo PS, 7 PSD e 1 Chega. As entrevistas serão publicadas e divulgadas pela ordem de chegada das resposta ao Jornal: Moisés Ferreira do BE, Joana Dias da CDU, Emídio Sousa da AD e Pedro Nuno Santos do PS.
Joana Dias, cabeça de lista CDU por Aveiro, é ajudante de Lar Residencial de CERCI e membro da direção da Beira Litoral do CESP. A eleita pelo partido na Assembleia de Freguesia de São João da Madeira, onde é membro da Comissão Concelhia do PCP, é membro da Comissão Executiva da Direção da União dos Sindicatos de Aveiro e da Direção Regional de Aveiro do PCP. Joana Dias integrou a Direção Nacional da Interjovem e é responsável pelo trabalho da entidade no distrito.
Ao JA apresentou a visão da CDU para uma descentralização diferente, com recuperação das freguesias extintas; e esclareceu a posição do partido sobre fundos europeus integrados em projetos para o distrito. A entrevista abaixo apresenta-se tal como nos foi enviada, a 28/2/2024.
Jornal de Albergaria (JA): Se pudesse apenas escolher uma, que medida do programa da CDU elegeria como mais determinante e urgente para a Região de Aveiro?
Joana Dias (JD): O programa eleitoral do PCP não é um “conjunto de medidas” avulsas. É uma proposta para o desenvolvimento económico, social e ambiental do país, com várias medidas que se interligam e complementam. Convidamos os leitores do Jornal de Albergaria a consultar o Programa Eleitoral do PCP e o Manifesto do Partido Ecologista Os Verdes para que possam, eles próprios, sem análises e comentários de terceiros, compreender melhor o alcance das nossas propostas, nas suas variadas vertentes. O Programa e o Manifesto eleitoral estão disponíveis no sítio de internet: www.cdu.pt/legislativas2024.
Ao contrário do apregoado, o País tem recursos para responder à exigência de uma vida melhor, de um Portugal desenvolvido e soberano. Recusando inevitabilidades e apontando um caminho alternativo, a CDU avançou com 30 medidas prioritárias para responder, agora, aos baixos salários e pensões, à degradação dos serviços públicos, aos preços da habitação, à injustiça fiscal, aos direitos das crianças e dos jovens.
Não é aceitável que os interesses da banca e dos restantes grupos económicos continuem a colocar em causa os direitos e as condições de vida da grande maioria da população. Só nos primeiros seis meses de 2023, os 20 maiores grupos económicos acumularam 25 milhões de euros de lucro por dia, a que acresce os 1.600 milhões de euros que o Orçamento do Estado inscreveu para benefícios fiscais. Há riqueza. Está é muito mal distribuída.
Assim, a primeira dessas 30 medidas prioritárias que apontamos é o aumento geral dos salários no sector público e privado. Um aumento mínimo de 15% e não inferior a 150€, a valorização das carreiras e profissões, o aumento significativo do salário médio, o aumento do Salário Mínimo Nacional (SMN) para 1000€ em 2024, e a sua progressiva valorização aproximando-a da média da Zona Euro.
O Salário Mínimo Nacional é a remuneração de referência para centenas de milhares de trabalhadores, abrangendo cerca de um quinto dos trabalhadores por conta de outrem. Meio século após a sua instituição, o SMN está profundamente desvalorizado. Segundo dados do Eurostat divulgados em Julho/2023, Portugal está na cauda da Europa no que respeita à evolução do salário mínimo em cada um dos 22 países da UE onde ele existe. Se o SMN tivesse sido atualizado todos os anos, considerando o custo de vida e o aumento da produtividade, o seu valor seria hoje muito superior.
Só esta medida permitiria aliviar significativamente as dificuldades de muitas famílias que hoje se deparam com dias a mais no mês face ao rendimento disponível. Uma medida que iria dinamizar o consumo interno e a economia, como se constatou após as subidas do salário mínimo (ainda que insuficientes) que se verificaram a seguir às eleições em 2015.
A elevação das condições de vida e a eliminação das injustiças está no cerne das propostas da CDU. Falamos da valorização dos salários, das pensões, da garantia de horários regulados que permitam conciliar a vida privada com a vida profissional, de garantir o direito a uma habitação digna, a uma escola pública de qualidade, de assegurar o direito à saúde, valorizando o Serviço Nacional de Saúde e os seus profissionais, falamos de acabar com as transferências de direito público para assegurar os lucros dos privados na área da saúde ou nos transportes. Falamos em investir na produção nacional, apoiando efectivamente as micro, pequenas e médias empresas (e não criando “programas de apoio” com condicionalismos e exigências tais que, na prática, apenas beneficiam as grandes empresas), apoiando a nossa pequena e média agricultura, as nossas pescas, a nossa indústria.
JA: A CDU propõe, no campo da descentralização, “o fim das comunidades intermunicipais como associativismo forçado” e o reforço da autonomia dos municípios e freguesias extintas. Para o partido, a CIRA – Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro cabe nesta categoria de “associativismo forçado”? Se sim, que benefícios teria o distrito, respetivos concelhos e freguesias, com o fim desta entidade?
JD: A política de desenvolvimento regional que o PCP e a CDU defendem para o país, contrasta, em muito, com as políticas que tanto PS, PSD e CDS têm implementado ao longo de décadas. A realidade do país demonstra o falhanço dessas políticas. Quando se encerram escolas, postos de correio, serviços públicos, centros de saúde, agências bancárias, serviços de transporte, em especial nas zonas do interior, não se está a contribuir para o desenvolvimento harmonioso do território. A falta de perspetivas de vida, de empregos, de acesso a serviços públicos, em muito têm contribuído para a desertificação de parte significativa do país, potenciado e agravando os efeitos de fenómenos como os incêndios florestais, acentuando desequilíbrios e assimetrias regionais.
No campo da “descentralização”, o que os Governos PS e PSD, com ou sem CDS, têm feito é antes uma desresponsabilização para as autarquias, seja transferindo competências que devem ser asseguradas pelo Estado Central (na área da educação ou da saúde, por exemplo) de forma a evitar discrepâncias no acesso a direitos fundamentais, seja transferindo o ónus da resolução de problemas sem transferir os meios financeiros necessários, comprometendo, ainda mais, a sustentabilidade financeira das autarquias, seja pela criação de estruturas sem legitimidade democrática.
O PCP defende um leque amplo de políticas integradas e dinamizadas por um poder regional decorrente da regionalização, conforme plasmado na Constituição da República Portuguesa, pelas Áreas Metropolitanas e pelas autarquias locais, dotadas de autonomia administrativa e financeira. Considera também que a extinção massiva de freguesias foi um erro que importa reverter, de acordo com a vontade das populações. Defendemos um poder local próximo das populações, em condições de contribuir, de acordo com as suas competências, para a melhoria da qualidade de vida dos munícipes, encorajando e assegurando a sua participação nos processos de tomada de decisões.
É neste quadro, que o PCP propõe o fim das Comunidades Inter-Municipais. Uma vez mais, não é uma medida avulsa, mas integrada num quadro de valorização das regiões e dos órgãos autárquicos, dotadas de meios e competências próprias, de verdadeira aproximação do Poder Local às populações.
JA: O programa eleitoral do PCP contempla a Linha de Alta Velocidade (LAV) na lista de investimentos a concretizar em “infraestruturas estratégicas”. O projeto, apesar de incluir Aveiro como um dos pontos da Fase 1 (Porto-Soure), a concluir até 2028, tem sido polémica no distrito, sobretudo em concelhos como Albergaria-a-Velha e Estarreja, onde se prevê a destruição de casas e terrenos. Que palavras dirige aos eleitores que mais vão sofrer e menos vão beneficiar com a LAV?
JD: A Linha de Alta Velocidade está consensualizada no país há cerca de 30 anos e é há muito anunciada. A CDU considera importante a concretização da LAV, a par de outros investimentos estratégicos e de investimentos importantes para o desenvolvimento local como a valorização e modernização da Linha do Vale do Vouga.
O impacto globalmente positivo da Linha de Alta Velocidade (LAV) Porto – Lisboa não deixa de induzir, pelo menos nas fases de projeto e construção, justas inquietações nas populações afetadas ao verem muitas vezes frustrado o investimento de uma vida, financeiro e emotivo, que julgavam seguro e de longo prazo, seja pelo efeito de barreira ou por via da destruição do edificado e/ou pela ocupação total ou parcial de terrenos.
O PCP tem defendido e apresentado nos órgãos autárquicos (neste caso em Estarreja onde tem um eleito na Assembleia Municipal) e na Assembleia da República, medidas que visam, por um lado assegurar a devida informação às populações, estudar e explorar todas as hipóteses com o menor impacto social, económico e ambiental e por outro, assegurar que os afectados pelo traçado sejam justamente compensados. Esta última proposta foi rejeitada na Assembleia da República.
O PCP relembra que os estudos para o traçado de LAV não se iniciaram agora. Lamentavelmente, e com responsabilidades acrescidas para as Infraestruturas de Portugal, foram poucas (ou nenhumas) as informações prestadas e opiniões recolhidas às populações. É também conhecido que, em algumas autarquias, foram aprovados projectos de construção em locais onde já se sabia serem passíveis de coincidir com o traçado de LAV.
Nesta fase, a CDU irá continuar a intervir para a definição e divulgação dos meios de compensação para as pessoas, empresas, e outras situações atingidas pelos impactos da LAV, bem como dos critérios usados para definir essas mesmas compensações, a forma, o modo e o tempo em que serão pagas.
JA: A CDU, como já esclareceu várias vezes, não quer sair da União Europeia. No entanto, defende a “necessária libertação do País da submissão ao Euro e das imposições e constrangimentos da UE”. Esta libertação comprometeria o acesso a financiamento europeu, tão presente em projetos no distrito? Se sim, que formas alternativas de receita têm previstas?
JD: A União Europeia continua a impulsionar políticas com vista à redução do valor real dos salários, da desregulamentação dos horários de trabalho e do aumento da idade de reforma. As actuais regras da UE restringem o investimento público, prejudicam o financiamento dos serviços públicos e as funções sociais do Estado – como na saúde, na educação, na segurança social, na habitação, na cultura ou na ciência – e promovem a liberalização e a privatização. A política do Banco Central Europeu (BCE), de aumentar e de manter as taxas de juro em níveis elevados, garante lucros fabulosos aos bancos à custa das famílias, das empresas e dos Estados mais dependentes e endividados. Não contentes, a UE reactivou o Pacto de Estabilidade, o que significa mais políticas de austeridade (ou “contas certas”), ou seja, mais ataques contra os direitos sociais e económicos das classes trabalhadoras. Todas estas políticas limitam as possibilidades de desenvolvimento económico e social e têm consequências profundamente negativas para a vida dos trabalhadores e dos povos, especialmente dos jovens, que vêem o seu futuro comprometido.
Dúvidas houvesse, as recentes declarações da Presidente do BCE, Christine Lagarde, são esclarecedoras ao afirmar que o abrandamento dos salários na zona euro é «encorajador», mas que ainda não chega.
O PCP, em contraponto, defende a criação de um Pacto pelo Progresso Social e pelo Emprego, orientado para a convergência real das economias e uma efectiva coesão económica e social. Defende uma profunda modificação das políticas comuns – agrícola, das pescas e comercial – e a criação de cláusulas de salvaguarda, exceção e derrogações que ajustem o estatuto de cada país à sua situação concreta. Defende a revogação da União Bancária e a criação de um programa que enquadre a possibilidade de saída negociada do Euro dos países que pretendam recuperar a soberania monetária.
Portugal precisa de se libertar do Euro e dos constrangimentos da integração monetária – condição necessária, embora não suficiente, para o desenvolvimento soberano do País. Precisa de uma moeda adequada à realidade e às potencialidades económicas do País, aos seus salários, produtividade e perfil produtivo, que concorra para os promover ao invés de os desfavorecer. Precisa de uma gestão monetária, financeira, cambial e orçamental autónoma e soberana, ajustada à situação nacional e que aproveite todas as margens de manobra para fomentar a produção, o emprego e o crescimento. Precisa de contar com um verdadeiro banco central nacional que suporte o seu projecto de desenvolvimento, libertando-o da dependência excessiva dos mercados financeiros e da condicionalidade política associada aos empréstimos da União Europeia e do FMI no financiamento do Estado.
A recuperação da soberania monetária representaria a conquista de um enorme campo de manobra. O País deve encará-la como um processo, eminentemente político, a ser cuidadosamente preparado, para garantir o pleno aproveitamento das vantagens e a minimização dos seus custos.
Importa clarificar que o acesso a fundos europeus não é exclusivo aos países que adoptaram o euro como moeda nacional. Actualmente, o euro é a moeda de 20 dos 27 países que compõem a UE. Os países da UE podem negociar uma cláusula de não participação em relação a qualquer ato legislativo ou tratado da União Europeia e decidir não participar em determinados domínios políticos. No caso da moeda única, a Dinamarca optou por não adotar o euro e manter a sua moeda nacional.
No que toca aos fundos europeus e ao seu acesso muito poderia ser dito. Passados quase 40 anos sobre a Adesão à CEE e 25 sobre a entrada no Euro, o mito da convergência por via dos fundos europeus esfumou-se. A tão apregoada convergência e a coesão económica, social e territorial no espaço da UE são hoje miragens face ao aumento real das desigualdades económicas, sociais e regionais. Nos apoios atribuídos às empresas, os dados disponíveis indicam que 31% do total é absorvido pelas grandes empresas, que são menos de 1% do total das empresas em Portugal.
Desde 1986, o saldo positivo das transferências da UE para Portugal (que são sobretudo os Fundos Estruturais), foi largamente ultrapassado pelo saldo negativo das transferências de rendimentos de Portugal para países da UE, fundamentalmente juros, lucros e dividendos obtidos no País. Ou seja, transferimos mais para a UE mais do que dela recebemos – eis o retrato de um país subordinado, dependente, endividado.
Mas a União Europeia não é a Europa. O PCP defende uma Europa assente na elevação dos direitos laborais e sociais, uma Europa respeitadora do direito ao desenvolvimento soberano e promotora de relações mutuamente vantajosas, uma Europa de cooperação entre Estados soberanos e iguais em direitos, respeitadora da democracia, que promova efectivas relações de amizade, de cooperação, de solidariedade com todos os povos do Mundo, uma Europa respeitadora do meio ambiente e que respeite e promova a cultura, a diversidade e o intercâmbio cultural.
JA: No cenário nacional, muito se tem falado do voto útil. Quem vota em círculos eleitorais mais pequenos – no fundo, fora do Porto e Lisboa – pode sentir-se atraído a escolher um partido com maior representatividade parlamentar. O círculo eleitoral de Aveiro com 642 mil eleitores elege 16 deputados para o Parlamento, quase todos PS e PSD. Esta dinâmica torna o voto na CDU menos apelativo?
JD: Pelo contrário, torna-o mais necessário. Anos após anos, está comprovado que o voto nessas forças políticas pouco tem beneficiado os eleitores do distrito. Ao invés, a solução política encontrada após as eleições de 2015, permitiu demonstrar que o país não está destinado ao declínio e ao retrocesso social.
A CDU foi a força decisiva não só para a recuperação de direitos roubados, como os feriados, mas também para o alcançar de novos direitos, outrora considerados “impossíveis”, como os manuais escolares gratuitos, a redução substancial do passe social e a valorização dos salários e das pensões (embora aquém do possível e necessário), a reposição das 35h na Administração Pública, o reforço do abono de família, entre outros. Nesse breve período, entre 2015 e 2019, foi possível elevar as condições de vida dos trabalhadores e das populações.
Sempre que a CDU sai reforçada, são os trabalhadores e as populações que saem reforçados. A Assembleia da República já tem demasiados deputados ao serviço dos grandes interesses. Faltam deputados ao serviço das populações. Afirmamos com confiança, o voto útil é o voto na CDU.
É o voto que não engana, que não defrauda expectavivas, que honra os seus compromissos. Nenhum voto na CDU é desperdiçado. Todos contam para o reforço eleitoral da CDU.